Nós, adolescentes e jovens do Estado do Pará, vivendo e convivendo com HIV/Aids, reunid@s no período de 25 a 28 de agosto de 2016, em Belém/PA, nas atividades denominadas “SEMINÁRIO JUVENTUDE É VIDA NA AMAZÔNIA” e “ENCONTRO ESTADUAL DE ADOLESCENTES E JOVENS VIVENDO COM HIV E AIDS”, com a participação de 86 pessoas, entre adolescentes e jovens da capital e do interior do Estado (cerca de 76% dos participantes), diversos parceiros sociais locais, gestores públicos das três esferas de governo, meios de comunicação e mídias alternativas cobrindo o evento. Foram dias de reflexão sobre temas abordados, tais como: promoção, tratamento, prevenção, co-infecções (hepatites virais, tuberculose, sífilis, etc) estigma sobre o vírus ideológico, políticas públicas de juventude, direitos humanos, educação e saúde, revigoramento da autoestima, troca de experiências entre outros assuntos pertinentes.
Ao final do mencionado evento, a plenária decidiu construir esta carta que traz algumas angústias legítimas do grupo presente, buscando colaborar com o poder público e a sociedade civil na melhora do cuidado de nós, adolescentes e jovens, que temos uma vida inteira para produção no país e que estas questões interferem diretamente na saúde da juventude positiva. Queremos a garantia plena no exercício dos direitos e deveres como cidadãos/ãs, por isso REQUEREMOS:
1. Necessidade de novos e readequação dos espaços já existentes (principalmente no interior), para atendimento aos jovens vivendo com HIV/Aids, objetivando discrição no acolhimento e respeito a nossa individualidade. A demanda de novos infectados aumentou (vide Boletins Epidemiológicos do Estado e Brasil) e não estamos conseguindo atender adequadamente ao que chegam e aos que precisam destes importantes espaços. Ampliar a estrutura de prevenção positiva entre pares de forma competente, para o bom resultado na adesão é uma necessidade fundamental;
2. Preocupamo-nos com as falhas na logística de distribuição de medicamentos antirretrovirais para o interior do Estado. Muitos medicamentos de segunda linha de tratamento não vêm chegando, em tempo real, para continuidade do TRATAR, comprometendo a adesão e os bons resultados já cientificamente comprovados desses/as respectiv@s usuári@s. Gostaríamos de ter informações e melhoramento do fluxo de funcionamento desta logística de distribuição;
3. PEC 241/2016: somos totalmente contra ao instituto legal que se apresenta que traz a proposta de relativizar a lei maior que é a Constituição Federal. Entendemos que o art. 196 e demais, do mencionado instituto legal, é cláusula que não se mexe. O SUS UNIVERSAL é uma conquista do povo brasileiro e deve ser operacionalizado como determinam, fielmente, as leis pertinentes 8.080/90 e 8.142/90 na prática da realidade da vida. A juventude paraense não abre mão de participar do diálogo deste pleito exigindo sua representação em todas as discussões que este assunto for levado, por sua importância no bem-estar social necessário ao seu tratamento;
4. Nós, enquanto adolescentes e jovens vivendo com HIV/Aids, atingid@s pelo preconceito, discriminação e estigma que reflete na família, na escola, no mercado de trabalho e nos demais espaços e relações sociais que se estabelecem, podendo muitas vezes influenciar a não adesão, solicitamos que o Estado estabeleça campanhas contínuas (não só as pontuais) que informem a sociedade sobre as novas tecnologias e evoluções científicas em IST, HIV/Aids e comorbidades, bem como determinar políticas públicas que estimulem o protagonismo juvenil autônomo e independente com apoio de recursos aos seus espaços de representação e militância, com a finalidade de suporte social ao trabalho que, seriamente, desenvolvemos;
5. Entendemos que o atendimento psicossocial especializado aos adolescentes e jovens vivendo com HIV/Aids é uma necessidade imperiosa para os bons resultados na adesão positiva. Contudo, destacamos um olhar, ainda mais determinado, aos adolescentes e jovens de transmissão vertical, devendo ser revisada a política de abrigos e determinada a obrigatoriedade que estes espaços tenham programas de ressocialização e reintegração plena de seu público na sociedade. Há de se ter uma política que possa apoiar este importante momento de transição entre a vida jovem positiva para a adulta. Para tanto, é fundamental o envolvimento das áreas da Assistência e da Previdência Social, viabilizando ainda o BPC para estes/as jovens que precisam deste apoio até os 24 anos de idade, podendo estar vinculado este benefício a frequência e resultados estudantis e em plena adesão ao seu tratamento, como estímulo à vida produtiva.
6. Segundo evidências científicas comprovam que adolescentes e jovens vivendo com HIV/Aids poderão ter uma vida plena e saudável desde que sejam ministrados medicamentos com menos toxicidade, diminuição dos efeitos colaterais e mais tolerância o que, inclusive, melhora a adesão. Neste sentido, solicitamos a incorporação de novas tecnologias medicamentosas no consenso terapêutico do Ministério da Saúde, de forma imediata a aprovação dos órgãos necessários de controle destes no país, objetivando que jovens possam ter sua vida adulta com qualidade plena de produção e com menos efeitos colaterais oriundos destes medicamentos já considerados mundialmente ultrapassados. Qualidade de vida e bem-estar social é preciso;
7. Preocupa-nos a postura de alguns/algumas profissionais de saúde que desconsiderando @s adolescentes e jovens como sujeitos de direito, demoram na troca de medicamentos (ARV) que não estão trazendo qualidade de vida a eles/as. Muitos por isso até abandonam o tratamento. Assim, requeremos que a aplicação dos consensos terapêuticos do Ministério da Saúde sejam flexibilizados na prática da vida, levando em consideração a adesão e a adaptação social d@s usuári@s a cada formulação aprovada no PCDT/DDAHV/MS. Não somos doença, queremos ser vistos humanamente.
8. Que o TRATAR não seja reduzido à área biomédica e que o psicossocial seja implementado, imediatamente, nos serviços como TRATAR, através da aplicação do Princípio Constitucional da INTEGRALIDADE DO CUIDAR (equipe multidisciplinar na atenção básica e especializada);
9. Que os métodos de prevenção combinadas existentes e discutidos, como possíveis de combater novas infecções, sejam implementados imediatamente nos serviços de saúde, com capacitação e treinamento das equipes, bem como divulgado a sociedade (via mídia aberta e campanhas) sobre estes métodos, com os pontos de atendimento, inclusive os de 24 horas ininterruptos no Estado do Pará.
10. Por fim, que se retome, seriamente, o Projeto “Saúde e Prevenção nas Escolas”, pois é na educação que entendemos ocorrer a grande mudança cultural e crítica do conhecimento de temas importantes como: saúde, sexualidade, reprodução, gênero, álcool e outras drogas, infecções sexualmente transmissíveis e outros que estão muito ligados com nossa luta e a juventude.
Por tudo acima relatado, REQUEREMOS aos órgãos governamentais pertinentes, agências de cooperação técnica, parceiros da luta social na Saúde, Direitos Humanos, Educação, Assistência Social e Previdência Social e Juventude o apoio na complementação do que ora se deseja como políticas públicas inclusivas, depois de 35 anos de epidemia.
Belém/PA, 28 de agosto de 2016.